A maternidade para mulheres negras, no geral, é permeada por questões que não afligem mulheres não negras. Ser mãe preta é viver em permanente estado de alerta e educar os filhos para um mundo cruel, cheio de subjetividades atravessadas pelo racismo.
O processo de colonização, a escravidão e o período pós-abolicionista, contado pela perspectiva de uma mulher negra, traz marcas dolorosas sobre a maternidade e a feminilidade. Ser mãe e mulher preta, passa pela violência de ser reprodutora de escravos para serem vendidos, muitas vezes fruto de estupros, pelo aleitamento e criação dos filhos dos seus senhores, poupando sua ama desse incomodo, pela negação de sua existência enquanto mulher.
No período pós-abolição, as construções sociais continuaram relegando às mulheres negras um papel de subalternidade, apagamento, sem acesso a oportunidades nem direito ao exercício pleno da maternidade e afetividade.
As cozinhas alheias, a falta de condições e acessos, a distância, a dupla, tripla jornada, também tiraram o direito de mulheres negras criarem seus filhos, de estarem presentes, de exercerem a maternidade em sua plenitude.
É possível ainda falar da solidão da mulher negra que, na construção social e nas relações afetivas estabelecidas, tem dificuldades de encontrar parceiros, formar família e ter filhos. Para a maioria das mulheres negras no Brasil, maternidade é uma ação solitária.
Essa ainda é a realidade de muitas mulheres e o processo de ser mãe ainda está em construção. Criar para o mundo! E que mundo é esse? Um mundo em que crianças negras com uniformes escolares são alvejadas, em que crianças não podem correr nas ruas porque viram suspeitos, em que a abordagem policial é violenta e guarda-chuvas são confundidos com rifles. O mundo em que a mãe negra nunca vai respirar tranquilamente enquanto o filho não chegar e que não importa o quão bem você tenha criado seu filho, ser negro é uma sentença, que às vezes é de morte. E isso é desesperador.
O racismo nos atravessa de maneira tão cruel, que mesmo em situação de privilégio, ele ainda se torna presente. Ainda assim precisamos educar nossos filhos para a sobrevivência.
Outro dia estávamos em casa e decidi oferecer para a minha irmã um pouco do nosso jantar, que estava maravilhoso. Pedi para o meu filho levar a comida até a casa da tia e, chegando lá, ele se deparou com algumas viaturas policiais. Congelou! Entrou desesperado na casa da tia, explicou o ocorrido: “Eu sou preto e estava com máscara”. Só quem é preto sabe o que sentimos.
Choramos! Essa dor é nossa!