Você sabia que a forma que criamos nossos filhos pode influenciar o modo como eles vivenciarão um luto quando adultos?
Acabamos de passar por mais um Dia de Finados, data em que homenageamos nossos entes queridos que partiram. Cada um de nós terá uma forma de expressar/ elaborar seu Luto, influenciada por uma série de fatores, como o tipo de vínculo que tínhamos com quem partiu, circunstâncias da morte, entre outros. Mas você sabia que a forma como fomos criados, o tipo de vínculo que estabelecemos com nossos pais ou nossas figuras principais de cuidado até nossos três anos de idade podem também ter forte influência na forma como expressamos nosso luto?
Quando comecei a estudar sobre saúde emocional, um dos temas que mais me chamou atenção foi a Teoria do Apego (ou Vínculo), desenvolvida pelo psiquiatra e psicanalista John Bowlby (1907 – 1990). Segundo Bowlby, a criança tem uma tendência a se vincular a uma figura principal de cuidado (geralmente a mãe, mas pode ser outro cuidador, desde que tenha uma relação constante), pois isso a ajudará a sobreviver neste mundo. O comportamento de apego seria instintivo, na visão de Bowlby, ou seja, a criança já nasce com uma predisposição biológica para formar vínculos que lhe ajudem a permanecer em segurança.
Alguns comportamentos inatos aos bebês, como chorar e sorrir, estimulariam o cuidado dos adultos. Assim, em sua visão, o que determinaria o vínculo entre a criança e seu cuidador seria a capacidade desse cuidador responder aos “chamados” do bebê, o tipo de cuidado oferecido.
A Teoria do Apego traz uma série de implicações sobre como essa relação de cuidado irá influenciar os demais relacionamentos vivenciados por essa criança até a sua fase adulta. Segundo Bowlby, a forma como uma pessoa se relaciona com as demais será guiada por este modelo interno criado ainda na infância!
O psiquiatria britânico Colin Murray Parkes, por sua vez, traça um importante paralelo entre a Teoria do Apego e o Luto, fazendo refletir sobre como as relações com nossos pais – nossas figuras principais de apego – enquanto somos crianças, podem influenciar o modo de vivenciarmos o luto quando adultos.
No caso de uma relação de apego evitativo, quando os pais são intolerantes à proximidade, os filhos podem também crescer intolerantes à proximidade e desconfiados das pessoas. Em uma situação de luto, poderão experimentar um luto inibido ou adiado, ou seja, não se permitirão vivenciar o luto e provavelmente precisarão de um reasseguramento, uma espécie de “permissão” para expressar sua dor.
Já quem viveu uma relação de apego ansioso/ ambivalente, pode também perpetuar em seus relacionamentos este tipo de vínculo que busca pela aprovação, receptividade e necessidade de se sentir aprovado pelo outro. No luto, o enlutado poderá sentir que tem uma espécie de compromisso para com o morto, ou seja, não pode criar novas amizades, ter novos interesses, seguir com a vida “em respeito” à quem partiu. Essa pessoa poderá precisar de permissão para “encerrar” o luto, isto é, para prosseguir sem estar focado somente na perda.
No apego desorganizado/ desorientado, há uma mistura de sentimentos: o indivíduo ora deseja ter uma relação mais próxima, íntima, ora se sente desconfortável com uma relação mais próxima emocionalmente. Quando vivencia um luto, pode precisar de apoio em dois momentos: seja o reasseguramento para vivenciar seu luto, seja a permissão para orientar sua vida para a restauração (encontrar um lugar para quem partiu em sua vida, mas não ficar somente focado na perda).
A Teoria do Apego de John Bowlby, bem como seu paralelo traçado por Parkes relacionando-a ao Luto nos mostram o quão relevante é o papel dos pais para a saúde emocional dos filhos – não apenas enquanto são crianças, mas por toda a sua vida!
Assim, ao olharmos nossos pequenos, ao buscarmos atender suas demandas, é importante que tenhamos em mente como todas as nossas respostas de cuidado contam para eles desde muito cedo. Sabe quando dizem que criança deveria vir com um cartaz: “Cuidado: contém sonhos”? Pois então… vamos cuidar desses sonhos?