Isolamento e maternidade

Facebook
WhatsApp
Pinterest
Email
Print
Imagem: arquivo pessoal da colunista
Imagem: arquivo pessoal da colunista

“Oi, Fê, tudo bem? Faz tempo que quero te escrever para dizer que, se eu puder ajudar em algo quando sua baby chegar, pode me escrever quando quiser, viu? Me ajudou (e ainda me ajuda) perguntar para outras mães como elas agiram em certas situações.”

 

Recebi esta mensagem de uma ex-colega de trabalho com quem não falava muito desde que saí do emprego para mudar de país. Eu estava grávida da minha primeira filha e o sentimento despertado por esse gesto, somado ao que eu vinha já vislumbrando sobre a maternidade, se tornou transformador para mim. Essa mão estendida, vinda de um lugar que não esperava, plantou uma ideia quase revolucionária em minha mente de que, como mães, precisamos nos unir e apoiar umas às outras.

 

Foi então que, ao inaugurar esta coluna, somente um assunto me vem à mente: a solidão materna. Tenho certeza de que grande parte das mães já passou por ela em algum momento, mas a situação que experimentamos hoje, em meio a uma pandemia que nos isolou uns dos outros, faz com que esse sentimento fique ainda mais aflorado. É aquela sensação de que não somos compreendidas em nosso maternar, de que estamos sozinhas, de que o mundo a volta nos esqueceu enquanto “estamos lá, cuidando das crias”. 

 

Para mim, a solidão na maternidade é uma companheira constante, o que é intensificado pelo fato de eu viver fora do Brasil. Costumo falar que minha quarentena começou há quatro anos, quando me mudei para o Canadá com meu marido, Fabricio. Moro na gelada cidade de Prince George, ao norte da província de Colúmbia Britânica, onde tive minhas filhas Clarice, de 3 anos, e Gabriela, que está com 10 meses. 

 

Ser uma mãe imigrante não é apenas sentir saudades da família, de amigos e da comida brasileira, é também abrir mão da rede de apoio, tão importante na maternidade. É não ter com quem contar na hora de precisar trabalhar, quando o cansaço aperta, nos momentos de dúvidas sobre como agir ou até em caso de emergência. Como quando tive uma crise de pedra nos rins com a Clarice ainda bebê. Sem ter com quem deixá-la e urrando de dor, lá fomos eu, meu marido e ela para o hospital. Já chorei muito pensando em como seria se eu estivesse no Brasil.

 

A palavra mãe não me define por completo. Mas equilibrar os pratinhos do dia a dia com as crianças e a minha individualidade, que grita por ter um espaço, ainda é um desafio. Na tentativa de reencontrar as outras várias Fernandas em mim, lembrei-me da mensagem enviada por minha ex-colega. O que me tocou ainda mais foi o fato de não sermos tão próximas. Ao me acolher como mãe, eu senti que não estava só. Também percebi que, ao sermos apoio umas para as outras, fica mais difícil cairmos na solidão do maternar. Saí em busca de formar a rede de apoio que tanto me faltava, mesmo que fosse só virtualmente. O WhatsApp virou um grande aliado.

 

Foram inúmeras as mensagens trocadas com outras mães para além do meu grupo de amigas. Algumas mães com pensamentos parecidos e outras com pensamentos muito diferentes dos meus. Todos respeitados e valorizados. A cada notícia de alguém grávida, mesmo que não fosse próxima, lá ia eu continuar a corrente da empatia e mandar uma mensagem me colocando à disposição para apoiar esse caminho da maternidade, assim como fizeram comigo. Nessa jornada, me reaproximei de pessoas queridas, ressignifiquei amizades, abri espaço para ouvir e ser ouvida. Criei uma rede. 

 

Claro que a rede virtual não substitui a física. Mas como em tempos de pandemia, aprendemos a usar os recursos remotos para atenuar os problemas decorrentes do isolamento, o que inclui a solidão materna. E assim vamos vivendo o isolamento – de quarentena ou de estrangeiro – com dias de certeza de que foi a melhor escolha com outros de questionar tudo e todos. Sei, porém, que não estou sozinha nessa. Espero que a gente consiga cada vez mais ter e ser apoio na maternidade, criando nossa pequena revolução para torná-la menos solitária. Vamos juntas nessa?

Artigos relacionados